segunda-feira, setembro 17, 2007

Abusos litúrgicos e São Tomás de Aquino


No passado dia 8 de Setembro, centenário da publicação da grande encíclica "Pascendi Dominici Gregis", de São Pio X, por um feliz acaso - porque efectivamente de um feliz acaso se tratou -, por volta das quatro horas e meia da tarde, tive a oportunidade de me encontrar a rezar por uns breves momentos na Capelinha das Aparições, no Santuário de Fátima.

Apercebi-me de que se preparava a celebração de uma Missa - de rito paulino, como é óbvio… -, com a numerosa participação de membros de um grupo juvenil cujo nome não consegui fixar, embora me recorde que nos pólos uniformizados que vestiam alguns deles tivessem nas costas uma face estilizada de Cristo, a qual de uma maneira pouco inocente recordava a do bandido e assassino comunista Ernesto "Che" Guevara, enquanto outros tomavam posição no coro da Capelinha guarnecidos de um vasto número de guitarras, pandeiretas e até um tambor!

De imediato, compreendi que estava à beira de principiar mais uma manifestação dos abusos e excessos típicos da nova liturgia modernista aberta ao homem e mundo, pelo que rapidamente me afastei do local, o mesmíssimo onde em Agosto de 2005 os peregrinos da Fraternidade Sacerdotal de São Pio X foram perturbados e enxovalhados tão-só por nele terem pretendido rezar da forma que a Igreja sempre rezou, o que diz bem das prioridades de quem sobre o dito tem autoridade directa.

Claro que não censuro os jovens que participam nestas manifestações - vítimas das circunstâncias da pobre época que lhes calhou viver, as quais nunca os deixaram conhecer o verdadeiro Catolicismo - e ainda menos julgo as suas intenções subjectivas, tarefa que incumbe exclusivamente a Deus; mas objectivamente não posso deixar de criticar a Reitoria do Santuário de Fátima, que, com soberbo desprezo por todas as determinações que Roma tem vindo a emanar sobre matéria litúrgica, permite que este tipo de tristes eventos continue a ocorrer.

Ora, tendo dedicado parte do tempo das minhas últimas férias à leitura da "Suma Teológica", de São Tomás de Aquino (a II Secção da II Parte - Questões 57 - 122, correspondente ao volume VI publicado pelas Edições Loyola, de São Paulo), o acontecimento que acima relato não pôde deixar de me trazer à memória os ensinamentos do Doutor Angélico acerca do uso do canto e música no louvor a Deus, e também sobre a hipótese de no culto do Deus verdadeiro poder haver algo de pernicioso, isto a propósito do "novus ordo" e seus abusos.

Assim, transcrevo de tal obra, da questão 91, artigo 2, a resposta que São Tomás dá à 4ª objecção:

(…) deve-se dizer como ensina Aristóteles: "Para ensinar não se deve usar flautas nem instrumentos semelhantes, como a cítara e outros, mas tudo que possa contribuir para os ouvintes serem bons", até porque esses instrumentos musicais movem mais a alma para o deleite do que para a formação da boa disposição interior. No Antigo Testamento, usavam-se esses instrumentos, quer porque o povo era mais grosseiro e carnal, e por isso deviam ser estimulados por tais instrumentos, como também pelas promessas terrenas; quer porque esses instrumentos materiais eram figurativos.

De seguida, cito a resposta emitida na questão 93, artigo 1:

Agostinho também escreveu que a mais perniciosa das mentiras é a dita contra a religião cristã. Consiste a mentira em contradizer com sinais externos a verdade. Assim como se pode significar algo mediante as palavras, pode-se também, mediante acções. Foi acima estabelecido que o culto religioso consiste externamente em acções significativas. Poderá, pois, o culto externamente manifestado, quando propõe alguma mentira, ser pernicioso.

(…) deve-se dizer que sendo Deus a verdade, somente invocam Deus os que lhe prestam um culto autêntico em espírito e verdade: um culto que contenha falsidade não será invocação salvífica de Deus.

Enfim, extraio da resposta proferida na questão 94, artigo 2:

Sendo o culto exterior sinal do interior, assim como é pernicioso uma mentira quando se afirma em palavras o contrário da fé que nutre na alma, também é perniciosa a falsidade quando no culto exterior se manifesta a alguém o contrário do que lhe vai no coração.

De facto, como é recomendável a leitura de São Tomás de Aquino: poderoso antídoto contra todas as falácias dos modernistas, e verdadeiro deleite para o espírito, o que não se ganharia na actualidade se todos os católicos com possibilidades para tal o lessem regularmente!

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